Tecelagem, cerâmica e a modelagem de biscuit são as técnicas que dão vida às peças dos artesãos da Associação de Arte e Artesanato Vale da Esperança (AAAVE), localizada em Caarapó, na região sul de Mato Grosso do Sul. A produção sustentável traz elementos do Pantanal e Cerrado e destaca a cultura regional. Dar visibilidade ao trabalho e fortalecer o grupo era uma necessidade para consolidar a iniciativa e gerar renda aos profissionais, um desafio que começou a ser superado a partir de 2022, com o conhecimento levado pelo Sebrae/MS, por meio do programa Cidade Empreendedora, executado em parceria com a Prefeitura Municipal.
Fundada em 1997, a Associação passou por momentos de altos e baixos, com oscilação no número de envolvidos, e hoje está em sua melhor fase, com 25 artesãos em atividade, grupo formado predominantemente por mulheres. Elas atuam com tecelagem de lã de carneiro, algodão e seda, utilizando tear manual e realizam tingimento natural, a partir de espécies de plantas nativas, entre elas a erva mate, a anileira, o guajiru, o gervão, o ipê roxo e o jatobá. A prioridade é valorizar a cultura regional e a sustentabilidade ambiental.
Apesar da tecelagem ser o carro-chefe, a Associação também produz cerâmicas de argila que representam os animais de Mato Grosso do Sul e cria outras peças com materiais variados, como por exemplo a massa de biscuit, na técnica da porcelana fria. Única fundadora a permanecer na entidade, a mestre artesã Josefa Marques Mazarão, que atua há 28 anos com tecelagem, está otimista com as conquistas do grupo. “É importante agradecermos o apoio de todos ao longo desse tempo, incluindo a Prefeitura, o Sebrae e a Fundação de Cultura de Mato Grosso do Sul, e também os amigos que nos estimulam trazendo ideias e sugestões. Queremos crescer cada vez mais! Conforme aumentarmos a produção, por exemplo, poderemos atender mais no atacado”, deseja a fundadora.
Como uma das vertentes do programa Cidade Empreendedora é o estímulo ao Associativismo, para alicerçar este novo ciclo, o acompanhamento do Sebrae/MS ao grupo promoveu aporte na gestão para contribuir com questões como planejamento, marketing e estratégia de venda. Os associados já estavam mobilizados, então a partir do plano de ação elaborado especificamente para a AAAVE, foi criada uma logomarca que proporcionou identificação e maior visibilidade aos produtos. Para alcançar os objetivos, também foram aplicadas diversas capacitações, tratando de temas como empreendedorismo feminino, precificação e redes sociais.
Conexão que amplia
Outro trabalho realizado pelo programa Cidade Empreendedora foi direcionado à procura por novos mercados para a venda. Neste sentido, o Sebrae/MS possibilitou a participação da Associação em diversos eventos a nível municipal, como o Dia da Oportunidade, realizado em Caarapó no dia 11 de julho, e estadual, como a 19ª RuralTur, que reuniu a exposição de produtos feitos no Estado e de outras regiões brasileiras entre os dias 12 e 14 de dezembro, em Campo Grande, o que trouxe visibilidade para as peças dos artesãos e a conexão com compradores, geração de negócios e a troca de experiências com outros empreendedores.
O horizonte de ampliar a atuação da Associação foi inspirado nesses eventos e em outros semelhantes. Na área da sustentabilidade ambiental, por exemplo, os projetos novos pretendem viabilizar a utilização de outros materiais, como bagaço de cana-de-açúcar, tecido de uniformes descartados e plástico para banner. Já na área da economia criativa, a AAAVE também está mobilizando os artesãos e outros empreendedores de Caarapó, das áreas de alimentação, música e demais serviços, para realizarem juntos uma feira no município para atrair clientes e dar maior visibilidade aos produtos. O evento será uma inovação para a cidade, que atualmente conta somente com a feira de produtos da agricultura familiar.
Qualificação que fortalece
Para garantir o futuro da entidade, a fundadora Josefa Mazarão está ensinando as técnicas tradicionais de produção para o filho João Marques Mazarão, que saiu do trabalho anterior para poder atuar exclusivamente na tecelagem e no tingimento natural. Além disso, encontrou na filha, Zenilda Mazarão, o potencial para cuidar da direção do grupo. “Toda parte administrativa, de correr atrás de recursos, de procurar material e de prestação de contas, por exemplo, que a presidência faz, precisa de um tempo que acabava fazendo a produção cair se a presidente é também artesã. Então hoje tenho na Zenilda meu braço direito (e esquerdo)!”, explica Josefa.
Economista e gestora pública por formação, Zenilda Mazarão iniciou a coordenação da AAAVE em 2020, depois que voltou a morar em Caarapó. Como a experiência que obtinha era toda no setor privado, ela precisou aprender mais sobre o terceiro setor e ação coletiva. “Com a vivência adquirida, eu defendo pelo menos quatro vantagens do Associativismo para o nosso caso: a visibilidade e venda dos produtos de todos do grupo quando estamos representados nas feiras; a economia no custo da matéria-prima, especialmente por comprar em maior quantidade e pelo valor do frete, que é único e atende vários artesãos; a união de talentos com reciprocidade e sem competitividade e; a oportunidade de vender no atacado”, elencou Zenilda Mazarão.
O esforço por qualificar-se somado às necessidades da Associação fizeram com que Zenilda em pouco tempo se tornasse especialista na elaboração de projetos e propostas para captação de recursos. Quando tomou conhecimento que essa competência precisava ser remunerada nos projetos que submetia para receber recursos de políticas de fomento, ela reconheceu que o que inicialmente era feito voluntariamente, na verdade era uma oportunidade de negócio.
Com essa virada e chave, Zenilda criou a empresa de assessoria Anaju para poder prestar esse serviço para outras organizações e, enquanto empresária, fez em 2023 o programa Sebrae Delas, que tem como objetivo aumentar a probabilidade de sucesso de ideias e negócios liderados por mulheres.
Como os associados em geral também fizeram os cursos viabilizados pelo programa Cidade Empreendedora, o estímulo ao empreendedorismo está impregnado nas ações e é um dos diferenciais da AAAVE no município, dentre as instituições que atuam nas comunidades. Ou seja, o conhecimento adquirido está sendo multiplicado. “Nossas oficinas buscam promover uma mudança de mentalidade e maior autonomia financeira, impactando na dignidade”, afirma Zenilda.
A Associação desenvolve vários projetos que transmitem conhecimento para formação de novos artesãos e estimulam pessoas em situação de vulnerabilidade social a recuperar a autoestima, produzir arte e gerar renda. Com apoio da Prefeitura, as oficinas ministradas para a comunidade beneficiaram aproximadamente 90 crianças e adultos em 2023, participantes de turmas oriundas de escolas públicas e programas sociais no Centro de Atenção Psicossocial (CAPS), no Centro Marie Ariane (CEMA), no Projeto Revivi, no Projeto Benjamim e no Estabelecimento Penal Masculino de Regime Fechado.
Arte que recupera
As oficinas ministradas não apenas estimulam o empreendedorismo, mas também exercem função terapêutica, auxiliando as pessoas a superarem sérias adversidades como depressão, dependência química e violência doméstica. A arte-terapia é ministrada pela vice-presidente da AAAVE, Solange da Silva Santos Francisco, que destaca a concentração exigida, a criatividade para gerar peças singulares e a satisfação de criar algo belo com as próprias mãos a partir de materiais simples, como alguns dos fatores benéficos para quem pratica artesanato.
No entanto, antes de poder desenvolver essa linha de atuação, ela sentiu a necessidade terapêutica da arte na própria pele. Formada em Artes Visuais, Solange foi afastada das salas de aulas por causa de uma limitação no braço direito, causada pelo encurtamento do nervo, resultado das cirurgias para combater o câncer de mama. Apesar da recuperação física, ela ficou fragilizada emocionalmente. “Eu estava sem forças, mas sou cristã praticante, não aceitava ficar prostrada, sentia que tinha que me levantar para fazer alguma coisa. Como eu fiz artesanato com biscuit por muitos anos, visitei a Associação e a dona Josefa me estimulou a voltar a ser artesã. Ninguém acreditava muito, achava que seria um lazer, mas eu aprendi a ser ceramista e com persistência construi um bom negócio”, contou Solange Francisco.
Inicialmente ela ganhava somente R$ 50 reais por semana, mas depois passou a receber R$ 800 por mês. O que possibilitou que ela chegasse aos R$ 4 mil mensais foi a participação no curso oferecido pelo Sebrae/MS de precificação dos produtos, realizado no começo do ano passado, que ensinou a valorizar a corretamente as peças e a usar ferramentas para fazer a contabilidade.
Enquanto artesã e empreendedora, ela conquistou independência financeira, e como instrutora, trabalha com a satisfação de colaborar para que outras pessoas também se recuperem de momentos difíceis. No contato com as turmas dos projetos sociais, por vezes, algum aluno conta que só teve ânimo e forças para sair da cama porque tinha o compromisso de participar da oficina. “É emocionante! Na correria do dia a dia não percebemos, mas quando Zenilda e eu fomos relacionar as atividades para uma apresentação em busca de recursos para um novo projeto que queremos desenvolver pela Associação, nós nos emocionamos ao ver o quanto já fizemos!”, reconheceu a vice-presidente.
Cidade Empreendedora
Voltado para promover o desenvolvimento local, a partir do fortalecimento dos pequenos negócios, o Cidade Empreendedora é um programa executado pelo Sebrae/MS em parceria com as prefeituras dos municípios interessados. Caarapó aderiu à iniciativa em 2022 e, de lá para cá, várias capacitações foram promovidas com a proposta de dar apoio ao comércio local e possibilitar que os empreendedores pudessem melhorar o desempenho dos negócios.
Paralelamente a esse trabalho de levar conhecimento aos empreendedores locais, o programa também atua para a melhoria do ambiente de negócios no município com iniciativas voltadas para a desburocratização de processos e formação de lideranças e gestores públicos que promovam o empreendedorismo.
Junto com Caarapó, outros 35 municípios também fazem parte do programa em Mato Grosso do Sul: Água Clara, Amambai, Aparecida do Taboado, Bandeirantes, Bataguassu, Batayporã, Brasilândia, Bela Vista, Camapuã, Chapadão do Sul, Costa Rica, Coxim, Deodápolis, Dourados, Inocência, Jaraguari, Ladário, Maracaju, Miranda, Naviraí, Nioaque, Nova Alvorada do Sul, Nova Andradina, Paraíso das Águas, Paranaíba, Pedro Gomes, Ponta Porã, Porto Murtinho, Ribas do Rio Pardo, Rio Brilhante, Rio Verde de Mato Grosso, Santa Rita do Pardo, São Gabriel do Oeste, Sonora e Terenos.
Para mais informações sobre o programa Cidade Empreendedora, acesse cidadeempreendedora.ms.sebrae.com.br ou ligue 0800 570 0800